sábado, 26 de abril de 2014

Alanis Morissete - Thank U - Obrigada - Traduzida

Dumb Ways to Die in Rio

Vědecký experiment: život není fér. Podívejte se, jak vám můžeme zachrán...





Experiência em praça pública, comprova que a roupa que você usa faz toda
diferença e pode salvar sua vida...
Veja o vídeo!



MUITO MUITO POUCO - Arnaldo Antunes (lyric-video)












Num porto seguro [En un puerto seguro
esperei te encontrar. [espere encontrarte.
Lua de não sei. [Luna de no ser.


Chris Herrmann
Trad. espanhol: Leo Lobos



Eu sei, mas não devia
Marina Colasanti
(1972)


Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra
vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma
a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não
abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma
a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol,
esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A
tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque
não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para
almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque
está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a
guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os
números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas
negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa
duração.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não
posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser
ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a
lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa.
E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber
que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais
dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver
anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e
engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na
infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e
cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os
olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da
água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a
não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta
no pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas,
tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma
revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e
torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os
pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola
pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a
gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono
atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se
acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e
baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que
aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.